sexta-feira, 12 de março de 2010

A DOUTRINA DA TRINDADE SEGUNDO TERTULIANO - PARTE II

Tertuliano e Hipólito desenvolvem as idéias de Justino e de Irineu. Para eles, Jesus é a Palavra que procede de Deus, com poder criador divino e que agora se torna homem. Ambos acentuam a realidade da carne de Jesus contra o dualismo gnóstico e docetismo. Ambos usam a idéia de Irineu do intercâmbio. E ambos afirmam que o divino e o homano são o mesmo. Hipólito antepõe, com muita ênfase, o pronome “estin”, quando enumera propriedades humanas e divinas de Jesus Cristo. Tertuliano demonstra que o Cristo divino não é outro senão o homem Jesus. Ele apresenta o Filho divino sem mais nem menos como o sujeito verdadeiro da vida humana e do destino de Jesus. “Deus se submete a nascer” de uma mãe humana e deve-se dizer, conforme a Escritura, que “o Filho de Deus morreu”.

Mas Tertuliano não fica preso a seus mestres na reflexão cristológica; distingui, no único Jesus Cristo, duas “substâncias”, a divina, chamada por ele também de espírito, e a corporal. Os milagres de Jesus ele atribui à substância divina, as fraquezas, como fome e sede, medo e morte, pertencem a substância humana. Dois motivos levam a esta maneira de considerar. Por um lado, aprendeu dos seus antecessores a significação do nascimento virginal de Jesus: Ele nasceu de um Pai divino e mais tarde de uma mãe humana. Mas nascimento implica participação na matéria constitutiva da origem; esta é a primeira significação da palavra substância para Tertuliano. Como Filho de Deus, Jesus participa da substância espiritual de seu Pai; como filho de Maria, participa da substância humana. Por outro lado, existiam várias heresias que obrigou Irineu também, a fazer esta distinção. Seus adversários gnósticos e marcionistas reconhecem Jesus como um ser de ordem divina, mas negam a sua verdadeira humanidade. Tertuliano apela então para as reais fraquezas humana de Jesus. Várias tendências monarquianas encontraram precisamente nisto uma nova prova contra a sua verdadeira divindade. A distinção entre substância ofereceu uma saída.

O nascimento da virgem não deve levar portanto à conclusão de que ele não seja um verdadeiro ser humano, como muitos pensavam, mas implica que ele é, de um lado, verdadeiro homem da nossa carne e de outro, que ele não é “total e absolutamente Filho dos homens”, pois é também de substância divina.

Argumenta-se contra a doutrina da encarnação que ela implica uma mudança enquanto Deus é imutável. ou: “Se ele nasceu e se revestiu de real condição humana, deixou de ser Deus porque Deus perdeu o que era, tornando-se o que não era”. Tertuliano diz que este princípio tem valor no caso de coisas terrestres; mas Deus é totalmente diferente; “Deus pode mudar-se em tudo o que existe, sem deixar de ser o que Ele é”. Com exceção da palavra mudar-se, que ele mais tarde vai corrigir, encontramos aqui uma idéia profunda que talvez sirva de pressuposto essencial para a idéia de encarnação: Sendo Deus a afirmação perfeita de tudo quanto existe e não havendo nada que lhe seja contrário, a encarnação não implica que Ele se torna algo distinto.

Dessas considerações surgem formulações que serão importantes para a história da igreja. Dizer: “A palavra se tornou carne e homem” significa então que ele se transformou em carne ou significa que se revestiu de carne. A primeira suposição é contrária a imutabilidade divina. Além disso: Se a Palavra se tem tornado carne por transformação ou mutação da substância, seria Jesus uma só substância, composta de duas, um tipo de análgama como o elétron, que é uma mistura de ouro e prata; neste caso não seria nem espírito nem carne: uma coisa mudando a outra, dando a terceira como resultado. Neste caso, Jesus não seria Deus: porque pela encarnação deixaria de ser a Palavra. Também não seria carne e homem: sendo a Palavra, não seria realmente carne. Sendo composto de dois, não seria nenhum dos dois, mas um terceiro ser, diferente dos dois”. Tal mescla contradiz a escritura que o chama filho de Deus e filho do homem. Tanto Deus como homem, com ambas as substâncias diferentes nas suas propriedades... Vemos uma condição dupla, não misturada, mas unida numa só pessoa, Deus e homem, Jesus... O que é próprio de cada uma das substâncias é tão inviolável que em Cristo o Espírito operou o que era do Espírito, a saber prodígios, milagres, sinais, enquanto a carne sofreu nele o que era da carne”, fome, sede, lágrimas, medo mortal e finalmente a morte.

A continuação do texto prova que a cristologia de Tertuliano não é tão amadurecida como fazem suspeitar as frases. Antes de mais nada é duvidoso se a expressão “única pessoa” indica a unidade do sujeito. Essas formulações não se impuseram de imediato; “uma pessoa de duas substâncias ou em duas naturezas se tornou a palavra-chave da ortodoxia latina só com Agostinho. Mesmo assim Tertuliano se mostra mais profundo do que seus antecessores no problema de Jesus, um e o mesmo, que é Deus de tal maneira que sua humanidade verdadeira em nada é diminuída e que é o homem de tal maneira que é Deus perfeito. Ele inventou expressões e elaborou conceitos que mais tarde foram aproveitados.

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