sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

AGOSTINHO E SEU PENSAMENTO

O mais notável pensador com que a ortodoxia contou no ocidente foi Agostinho. A igreja Católica o canonizou, mas sabe-se que a Reforma Protestante se inclinou mais coerentemente sobre Agostinho do que fez com relação a qualquer outro pensador de antes da Reforma. Agostinho tem de ser alinhado entre o mais raros gênios, que aparecem uma só vez no decorrer de cada milênio. O pensamento moderno lhe deve mais do que o reconhecimento a ele tributado o revela. O Bispo de Hipona fez com que a reflexão humana se tornasse capaz de atentar para dentro da própria mente, para que se auto-analisasse e, como foi dito por certo escritor, quase que a única coisa que Agostinho teria de aprender da psicologia moderna seria o jargão adotado. O nome de Agostinho ocupa lugar de destaque não só na história do dogma mas também na história geral da cultura. Além da teologia, os campos filosofia, literatura, governo eclesiástico e jurisprudência também foram influenciados por seus escritos. Lutero apoiou-se muito em Agostinho. Em seus primeiros anos, como regra geral, identificava sua posição com a de Agostinho. Foi o ensinamento agostiniano de pecado e de graça que Lutero desejava manter em oposição à doutrina da escolástica sobre a justificação. Isso também foi decisivo no que tange à relação entre Lutero e o Ocamismo Agostinho era homem do Ocidente, e as facetas mais proeminentes de sua teologia são as que se encontram no centro da teologia ocidental. O problema da igreja bem como as questões antropológicas, por , exemplo, foram respondidas por Agostinho de maneira tal que se tornaram básicas para o pensamento teológico nos séculos seguintes – e isto acontecia mesmo quando a posição de Agostinho não era inteiramente aceita. As doutrinas da graça e da predestinação de Agostinho suscitaram ampla controvérsia mesmo antes de sua morte, e continuaram a ocupar o centro da discussão teológica durante toda a Idade Média e mesmo, em parte, até no período após a Reforma. Os seguintes problemas assumiram importância especial: a extensão do livre arbítrio, o papel da graça na conversão e regeneração do homem e o significado da predestinação.

A VIDA E O PENSAMENTO DE AGOSTINHO

Para se compreender a teologia de Agostinho, é importante saber algo a respeito de sua vida e seu desenvolvimento interno, que influenciou a formação de sua teologia. A melhor fonte de informações é seu conhecido livro Confissão, escrito por volta do ano 400. Agostinho nasceu em Tagaste, na Numídia, em 354, seu pai era pagão, mas sua mãe era cristã, de modo que chegou a conhecer o cristianismo já muito cedo. Foi enviado a Cartago em 371 para estudar. Enquanto ali vivia, levava uma existência completamente mundana até ler o Hortênsio de Cícero, que criou nele o amor à filosofia. O desejo de encontrar a verdade substituiu o desejo de obter a riqueza e fama. Anos mais tarde reconheceu essa mudança de pensamento como um passa em direção ao cristianismo. “Ó verdade, verdade, quão ardentemente minha alma ansiou por ti nessa época!” Desde o início parecia até certo ponto claro a Agostinho que a verdade não poderia ser alcançada a não ser em Cristo. O que o impedia de crer era linguagem não filosófica e (como ele a considerava) bárbara da Bíblia. Também não conseguia submeter-se à autoridade da Bíblia, o que exige fé. Pouco tempo depois do incidente acima mencionado, Agostinho uniu-se aos maniques, seita que tinha bom número de adeptos na África. Esse grupo, fundado por Mani, um persa, no terceiro século, tinha muito em comum com o gnosticismo. Mas seu dualismo era ainda mais radical; não era simplesmente dualismo entre Deus e o mundo, mas acima de tudo entre Deus e o mal. Os maniqueus consideravam o mal como o princípio independente ao lado de Deus, poder que limitava o domínio de Deus e contra o qual Deus combatia. Seu sistema de salvação lembra o plano gnóstico, e este, em geral, fornecia ao maniqueismo uma explicação ampla e especulativa do mundo. O maniqueismo também se caracterizava por seu código de ética ascético, que frequentemente chegava ao oposto – ao libertinismo – entre seus membros. Agostinho foi atraído ao maniqueismo pro sua explicação racional do mundo, bem como pelo seu código ascético, que temporariamente ofereceu uma solução a seus problemas. Mas o caráter fraudulento da posição maniquéia se lhe tornou cada vez mais evidente, e depois de 9 anos abandonou as suas fileiras. No mesmo ano, 383, Agostinho atravessou o mar, indo até a Itália. Viveu em Milão, onde entrou em contato com o famoso teólogo e prelado Ambrósio, que exerceu influência decisiva sobre ele. Ambrósio representava a posição teológica ocidentel, mas também ficara profundamente imressionado com a teologia do Oriente, bem como com a filosofia grega. Entre outras coisas, apropriara-se do método alegórico de interpretaçào de Filo e Orígenes. Esse método chegou a ter grande significado para Agostinho, uma vez que lhe permitiu pôr de lado algumas passagens da Escritura que considerava inaceitáveis. Em suas pregações, Ambrósio salientava com vigor o conceito paulino de justificação através do perdão dos pecados, e também isto foi de grande importância para Agostinho. Primeiramente Agostinho dirigiu-se ao neoplatonismo. Foi em grande esta escola de pensamento que o afastou do maniqueismo. O conceito neoplatônico de Deus era diametralmente oposto ao conceito maniqueu. Aquele concebia Deus como o bem absoluto, imutável, situado acima de toda mudança, a fonte de tudo que existe. Tal concepção era incompatível com a idéia que o mal é princípio independente, e com a suposiçào que Deus combatia o mal e era, portanto mutável, exposto às modificações existenciais. O mal não pode ser algo independente, princípio criador e eficiente. No contexto neoplatônico, conceitua-se o mal como qualidade negativa, não ser, ausência de bem . Agostinho aceitou esta definição de mal, a qual constituiu a origem de seu diagnóstico da natureza do pecado. O impacto do pensamento neoplatônico se percebe claramente na seguinte passagem de suas Confissões: “Mas, tendo então lido aqueles livros dos platonistas, e neles tendo aprendido a procurar a verdade incorpórea, descobri tuas coisas invisíveis, entendi pelas coisas criadas... Então certifiquei-me que existes, que és infinito... e que verdadeiramente és aquele que é sempre o mesmo, sem variação em qualquer parte e sem movimento; e que todas as outras coisas procedem de ti, neste terreno seguro apenas, é que existem.... É posteriormente, quando meu espírito foi conquistado por tua Bíblia... aprendi a distinguir entre presunção e confissão – entre os que vêem aonde deve ir, mas não vão, e o caminho que conduz não apenas à visão mas também à morada na terra abençoada”. (VII,20). Mas apesar disso disso, foi uma passagem da Carta de Paulo aos Romanos que destruiu os últimos vestígios de resistência e facilitou a conversão de Agostinho ao cristianismo. Estas foram as palavras decisivas: “Andemos dignamente, como em pleno dia, não em orgias e bebedices, não em impudicícias e dissoluções, não em contendas e ciúmes; mas revesti-vos do Senhor Jesus Cristo, e nada disponhais para a carne, no tocante às suas concupiscências” (13.13-14). Estas palavras levaram Agostinho a abandonar sua vida mundana; e dirigiram seus desejos ao transcendental, não para a vantagem temporal, mas afim de melhor compreender e contemplar a Deus. Sua vontade fora abatida, mas restaurara-se novamente de modo definitivo. A conversão de Agostinho significou mais do que abandonar sua ambição de se tornar um retórico famoso. Anteriormente fora escravo de desejos mundanos, mas isso agora passara, e seus pensamentos se voltaram a coisas espirituais. Ao mesmo tempo submeteu-se aos ensinamentos e a autoridade da igreja. Foi a fé em Cristo que tornou o transcendental realidade viva para Agostinho. Depois de sua conversão, Agostinho e mais alguns cristãos fiéis se retiraram a um lugar denominado Cassiciaco, fora de Milão, e depois de algum tempo foi batizado nesta cidade, em 387. No ano seguinte voltou a Cartago. Durante a viagem, sua mãe faleceu – o que o afetou por longo tempo. Depois de viver em Cartago por alguns anos. Agostinho foi eleito presbítero na igreja em Hipona. Mais tarde ficou sendo Bispo da mesma cidade (395). E ai permaneceu até a sua morte ocorrida quando os vândalos invadiram a região e sitiavam Hipona em 430. Muitas são as interpretações feitas quanto o significado da conversão de Agostinho. Vários pesquisadores protestantes, inclusive Harnack, afirmaram que sua conversão, como os Solilóquios, são citadas como prova. Com base neste livro (escrito em Cassiciaco), o significado da conversão foi diminuído - o que é bem o contrário do que o próprio Agostinho diz dessa experiência. Pesquisadores Católicos apoiam a reivindicação feita nas Confissões e consideram a conversão como mudança genuína, em consequência da qual Agostinho chegou a alcançar a fé cristã e a se submeter aos ensinamentos da igreja. Como resultado das investigações de Norregaard e Holl, esta última interpretação é hoje, em geral, aceita. Holl demonstrou que os estudos filosóficos de Agostinho, que ele naturalmente continuou após a sua conversão, receberam enfoque diferente.

Um comentário:

  1. Olá Pr.Robson!
    Parabéns pelo blog, as matérias estão excelentes, já estou seguindo.
    Quero aproveitar para divulgar o meu blog http://wwwadoradoresemverdade.blogspot.com/ quando puder faça uma visita.
    Um abraço fik na paz.

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